Publicado em julho 11, 2012 por
Estátua de Luiz Gonzaga em Campina Grande, na Paraíba. Foto: UOL
Fonte: Portal EcoDebate
[EcoDebate]
Estamos celebrando aqui no Nordeste os cem anos do nascimento de Luiz
Gonzaga. Nasceu em 13 de Dezembro de 1912. Além da dimensão artística, é
indubitável o papel de sua música na difusão do imaginário sobre o
Nordeste, inclusive do ponto de vista ambiental e social.
Fiz com Targino Gondim e Nilton Freitas o CD “Belo Sertão”, numa
tentativa de valorizar a importância social da música de Luiz Gonzaga.
Fizemos um diálogo de composições como o pout pourri de Asa Branca (Asa
Branca, Triste Partida e Volta da Asa Branca), Súplica Cearense, Jesus
Sertanejo, Riacho do Navio, etc. Fomos dissecando o que significa cada
uma dessas músicas nesse contexto, porque elas existem, qual a razão de
tanta celebridade desses clássicos nordestinos. Ao mesmo tempo, na
lógica da convivência com o semiárido, compusemos – inclusive com outros
compositores – Água de Chuva, Beleza Iluminada, Belo Sertão, Boato
Ribeirinho, Estalo de Fogueira e outras.
Curioso como esse trabalho se difundiu no Nordeste muito mais nas
escolas, universidades e setores da educação popular que propriamente no
mundo do show business. Há inclusive monografias de mestrado estudando o
semiárido a partir da música, influenciadas pelo que viram e ouviram no
CD.
Foi Luiz Gonzaga, junto com seus poetas como Zé Dantas, Patativa do
Assaré e Humberto Teixeira – muitos outros – que divulgaram o sertão
nordestino que está no imaginário do povo brasileiro. Claro que pintores
como Portinari, poetas como João Cabral de Melo Neto, romancistas como
Graciliano Ramos, dramaturgos como Ariano Suassuna, se somaram nessa
divulgação, mas como uma crítica à crueldade da fome e da sede que
pairavam sobre o semiárido.
Hoje temos a convivência com o semiárido. Acabamos com as grandes
migrações, as frentes de emergência, a mortalidade infantil, os saques.
Mesmo numa seca como essa, a tragédia social já não reina como nos
tempos da “Asa Branca”.
A música de Gonzaga continua viva por ser uma obra prima da cultura
popular, mas a nossa realidade mudou. Há muito por caminhar, mas grande
parte do caminho foi feito. Gonzaga gostaria de ver a volta de grande
parte dos migrantes nordestinos para o Nordeste.
Sem perdermos nossas raízes culturais, principalmente a musical, hoje
já podemos fazer novos baiões, novos xotes, novos rastapés, um novo
forró, para a alegria nordestina que nunca morre.
Nesses cem anos de nascimento de Luiz Gonzaga, o Rei do Baião vai
fazer a festa no céu enquanto nós a faremos aqui na Terra, até o dia que
Deus permitir.
Roberto Malvezzi (Gogó),
Articulista do Portal EcoDebate, possui formação em Filosofia, Teologia
e Estudos Sociais. Atua na Equipe CPP/CPT do São Francisco.
Beleza Iluminada
A cena das mulheres carregando suas latas de água na
cabeça é clássica. A beleza rude da cena não pode ocultar todo o
sofrimento imposto ao corpo feminino. Começando desde criança, as
mulheres carregarão em sua pele, em seus músculos, em seus ossos a
dureza desse trabalho repetitivo e pesado. Com o passar dos anos
alargam-se os ombros, enrijecem-se as batatas das pernas, aparecem os
problemas de coluna. A cena, porém, tem sua beleza. Caminhando esguias e
retilíneas, forçadas pelo equilibrio da lata d'água sobre a cabeça, é
praticamente um desfile sobre as estradas calcinadas do sertão. Para
alguns também é um momento em que as mulheres se encontram a sós, longe
dos homens e onde podem conversar a vontade seus problemas pessoais. OUÇA/BAIXE AQUI
Água de Chuva
Essa música foi e é fundamental na cultura semi-árida.
Ela é artisticamente original e linda, socialmente densa, registra a
crueldade da realidade, a manipulação política, mas não aponta saídas,
exatamente porque naquela época, não se tinha claro as saídas. Mas hoje
elas existem. Por isso, sem a pretensão de alcançar o nível artístico
desses homens, já se faz música falando da convivência com o semi árido,
afirmando claramente que a vida aqui é possível sempre, com dignidade,
desde que a adaptação ao ambiente seja feita com respeito a natureza e
associando-se a ela, não combatendo-a. Um dos segredos chaves da
convivência com o semi-árido é guardar a água no momento das chuvas e
tê-la nos momentos em que naturalmente não chove. OUÇA/BAIXE AQUI
Música do CD Belo Sertão, para saber mais, clique aqui